A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) decidiu multar em R$ 3.245.455,78 o trader Fernando Reina Rebane que, por meio de suspeitas operações de contratos futuros em dólar, conseguiu lucrar R$ 1.411.666,00.

De acordo com o relatório da autarquia, esse lucro milionário foi fruto de 249 operações de compra e venda (“day trade”) de contratos futuros de dólar entre 6 de janeiro de 2011 e 24 de agosto de 2012.

O que chamou a atenção, no entanto, foi a alta taxa de sucesso nessas operações, que foram intermediadas por uma corretora que não teve seu nome identificado no documento.

A Superintendência de Relações com Mercado e Intermediários (“SMI”), então, ao investigar o caso, encontrou indícios de conluio entre Rebane, a corretora e um operador — que não teve sua identidade revelada, mas que seria cunhado do trader e era o responsável pela execução das ordens nessa corretora.

Esquema investigado pela CVM

O esquema, segundo a SMI, funcionava da seguinte maneira: as ofertas eram inseridas no sistema de negociação sem a identificação qualquer do comitente, utilizando-se do código de cliente inexistente (“código zero”).

Quando essas ordens eram executadas e já havia o conhecimento sobre os resultados de compras e vendas dos contratos futuros, os melhores preços seriam “direcionados para Fernando, em detrimento de outros clientes da corretora atendidos simultaneamente pelo operador A.M.G”.

Isso, contudo, somente foi possível “em função de a especificação dos negócios cursados no segmento BM&F ser realizada dentro das ‘janelas’ de especificação da B3.” 

A Bolsa de Valores exige por meio desse sistema a especificação do comitente em negócios realizados em certo intervalo do dia seja feita até um horário limite. Essa regra, porém, não abarca os administradores de carteiras e de fundos de investimento.

Eles podem especificar as ordens para o cliente até às 19h30 do dia da realização dos negócios.

Altos ganhos na manipulação

Esse intervalo de tempo, segundo a CVM, teria “permitido que, com o conhecimento do resultado dos negócios, os melhores preços das compras ou vendas fossem atribuídos a Fernando”.

Somente no dia 23 de maio de 2012, “os referidos negócios resultaram em lucro de quase R$ 180 mil para Fernando”. 

No dia seguinte, porém, não teria havido a mesma lucratividade, mas ainda assim levantou R$ 112.745,00. O fato é que, segundo a SMI, teria ocorrido um grande esquema. 

Um comitente que no processo foi identificado como XMZ lucrou R$ 203.750. Essa pessoa, no entanto, possui carteira gerida pelo sócio e administrador de uma empresa identificada no relatório como K.A.M., da qual Fernando Rebane declarou ser trader, à época do seu cadastro perante à corretora.

“Fernando confirmou ser cunhado do operador A.M.G. e ter trabalhado para a K.A.M., onde transmitiu ordens de negociação para ele e para o fundo XMZ, cujos ativos eram geridos pela K.A.M. Para justificar seus resultados, Fernando alegou ter desenvolvido algoritmo para comprar e vender ativos”.

Da BSM a CVM

O caso, então, chegou até a CVM, após um processo administrativo disciplinar na BSM Supervisão de Mercados. O processo foi instaurado para apurar a ocorrência de prática não equitativa na negociação de contratos de dólar no mercado futuro e de falhas operacionais na corretora I.B.

“Ao final do procedimento, formulou acusações em face do operador A.M.G., de dois diretores e da própria corretora. Os diretores e a corretora firmaram termo de compromisso cujo cumprimento acarretou no arquivamento das acusações”. 

O operador A.M.G., cunhado de Fernando Rebane, foi condenado “à penalidade de inabilitação temporária por 1 ano, por prática não equitativa, pela Turma do Conselho de Supervisão da Mercados BSM”.

Defesa do trader e resultado

Rebane afirmou que a SMI teria inferido que a taxa de sucesso estaria muita acima dos demais investidores, sem, no entanto, trazer índices comparativos para respaldar tal afirmação.

A defesa do trader sustentou que “Fernando teria conseguido taxa de sucesso superior a 90% em operações não intermediadas por A.G.M., o que revelaria a inexistência de conluio entre eles para alcançar os resultados relatados pela Acusação”.

Antes de comentar sobre o mérito, contudo, foi alegada a existência de prescrição da pretensão punitiva da CVM, uma vez que teria se passado mais de cinco anos para apuração dos fatos que ocorreram em 2011 e 2012.

Nada disso porém mudou a forma da CVM julgar o caso. O voto do Diretor Relator Henrique Machado foi pela “condenação de Fernando Reina Rebane à multa de R$ 3.245.455,78, correspondente a 1,5 vezes o valor do benefício obtido atualizado pelo IPCA-E de março de 2019, tendo como data inicial a data do último pregão realizado pelo acusado”. O colegiado da CVM, então, seguiu unanimemente o voto do relator.